Não tá morto quem peleia

Desde a penalidade perdida por Gustavo Sapeka, calou fundo no torcedor Áureo-Cerúleo um sentimento de inconformidade. É verdade que o destino, em seus desmandos, há muito dava sinais daquele provável desfecho, sacramentado na disputa de pênaltis. Não foram poucas as vezes que coube a mim ser o arauto dos maus presságios que cercavam a campanha Áureo-Cerúlea ao longo da competição, como escrevi em várias das crônicas. Um time sempre titubeante e inconsistente, que se mostrou frágil mentalmente na hora mais grave, a despeito do apoio de seu torcedor. Contudo, diante do fato de o certame ter sido decidido pelos dois piores classificados na fase de grupos, fica evidente que, com um pouco mais de competência (e sorte), o objetivo final poderia ter sido alcançado. Mas não há tempo para se lamentar: outra competição se avizinha, na qual cabe ao Lobo representar com dignidade sua torcida apaixonada, que seguirá lhe apoiando incondicionalmente. Assim é ser do Esporte Clube Pelotas: embarcar em um voo cego de destino incerto a cada competição que se inicia, torcer com fervor independente do resultado final, amar la trama más que el desenlace. Desistir, fugir da raia, arregar? Jamais. Por isso, apesar dos reveses e dos pesares, lá vamos nós outra vez.

Em que pese o esforço hercúleo empregado por qualquer dirigente abnegado em presidir um clube do interior, com suas limitações financeiras e estruturais – e cabe ressaltar que, entre todos, o desafio de ocupar a cadeira mais alta na hierarquia do Esporte Clube Pelotas está entre os maiores -, é um alívio ao torcedor que Gilmar Schneider não mais seja o mandatário Áureo-Cerúleo. Isso não significa que não exista um legado: sobretudo no campo administrativo e financeiro, o clube recuperou fôlego e credibilidade, o que deixa às gerações vindouras um terreno menos inóspito do que o encontrado por Gilmar quando de sua chegada. Porém, o saldo do campo é extremamente negativo, com um desempenho esportivo muito aquém daquilo que o Pelotas pode e deve almejar. A falta de conhecimento futebolístico foi uma marca da gestão Schneider e permeou todas as más decisões e erros de avaliação que fizeram com que, ao fim de seu mandato, entregasse o clube exatamente onde encontrou: na Divisão de Acesso do estadual. Para além do resultado, o relacionamento com o torcedor ao longo dos anos em que esteve presidente foi áspero, distante e protocolar, e colaborou para um distanciamento jamais visto do Clube com sua torcida. O tom sorumbático e pessimista de suas entrevistas é o exemplo perfeito de sua liderança pouco aglutinadora, e ainda pairam no ar dúvidas quanto à concretização do tal “projeto imobiliário que vai mudar a vida do Pelotas”, ao qual me reservo o benefício de “ver para crer”, após tantas ilusões terem sido vendidas. Tomara que se concretize, para o bem do Pelotas e da imagem do próprio Gilmar, de quem sou crítico enquanto ex-mandatário, jamais como pessoa.

Cabe agora a Moacir Elias, por muitos anos Presidente do Conselho, ocupar o cargo de Presidente, que, a meu ver, lhe cai muito bem. É notória sua habilidade na condução dos assuntos que concernem ao clube enquanto profundo conhecedor da história e da cultura Áureo-Cerúleas, iniciando pela decisão de disputar a Copa FGF em respeito à torcida, que merece essa contrapartida. Ainda que lidando com a escassez de recursos financeiros, montou-se um grupo de boa mescla entre jovens e experientes, até acima da expectativa geral, dados os nomes apresentados. Pensando na Divisão de Acesso de 2023, o Pelotas optou por um comandante experiente e conhecedor do certame: após anos de “flerte” de ambas as partes, Leocir Dall’Astra chega ao Pelotas com a expectativa de que esta união resulte em uma retomada dos anos vitoriosos de ambas as partes. O objetivo primordial inequívoco é a formação de uma espinha dorsal para o grupo de 2023. Todavia, basta observar o quadro de campeões das Copas da FGF para chegar à conclusão de que o Lobo sempre deve ser levado em consideração pelos seus adversários enquanto candidato a erguer mais esta taça.

Logo de saída, se erigia no horizonte o mais imponente dos compromissos: um encontro marcado com o maior rival, combalido por outro rebaixamento consecutivo. Entretanto, mesmo após confirmar presença, foi escolha do co-irmão declinar à disputa do clássico e da competição e passar o cadeado nas portas. Resultado: W.O. e 3×0, placar que ainda assombra os rubro-negros cujas retinas ainda guardam as imagens dos golaços de Bruno Coutinho naquela noite de setembro em que, curiosamente, também pediram arrego. Em verdade, uma pena: não há nada mais sagrado que os 90 minutos (às vezes, menos) agônicos de futebol que apenas um embate entre amarelos e vermelhos é capaz de proporcionar. Renunciar ao confronto é desmerecer uma história centenária de duelos épicos e negar às duas torcidas o clímax do torcer. A história deverá cobrar explicações do lado de lá, aos responsáveis por essa vexatória e covarde decisão.

Porém, para os lados da Avenida, vida que segue. E como é bom estar vivo!

Na ausência de contrapartida ao destemor Áureo-Cerúleo dentro da rivalidade braPEL, caberá ao Farroupilha ser o sparring do momento. Com odds amplamente favoráveis, é dever do Pelotas, cuja casa deverá sediar o confronto, confirmar o favoritismo e apresentar suas credenciais na competição que se inicia. Em um grupo composto ainda por União Harmonia e Sapucaiense, é esperado que o Lobo seja soberano e possa dar rodagem ao elenco, visando avaliar suas valências e debilidades. É o início de uma nova jornada azul e ouro, que sabe lá Deus onde irá nos levar. As únicas certezas são que o Lobo, como sempre, terá o apoio de sua gente, e que não tá morto quem peleia.

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